quarta-feira, abril 25

O que ela não disse...

[Ela sai do trabalho, com a meia-luz do por-do-sol escapando pelas janelas do hall dos elevadores. Aperta o botão e se prepara para esperar, enquanto fala ao telefone.]

-- Olha, então vou esperar você me ligar. Vou buscar as crianças e te espero, pode ser?
-- Tudo bem, Gustavo, pode ser.

[A voz dela estava pesada. Ele sabia o porquê, mas não queria de novo entrar neste assunto chato. Por isso, ia buscar as crianças, nunca dava tempo, hoje ele ia no lugar dela. Às vezes ele fazia isto, se antecipava para deixá-la chegar em casa antes dele, para encontrá-la sentadinha, lendo. Ele gostava tanto da cena, mas sabia que se contasse a ela, perderia a graça.]

-- Eu acho que chego logo aí. Posso ir, não quer?
-- Não, hoje eu vou, aproveita e chega com a casa ainda em silêncio.

[Chega o elevador que vai à garagem. Mais quatro executivos engravatados o esperavam agora. E os quatro esperaram mais uns segundinhos, para que ela entrasse primeiro. Ela olhou rápido, concentrada no que falava o marido. Mas, mesmo no relance, ela reparou quem era um dos que entravam no elevador... Um arrepio na espinha.]

-- Gustavo, eu amo você.
-- (...)

[Pela primeira vez não teve receio de dizer, tão fora do contexto, tão ressoante e com tanta certeza do que de todas as vezes, em mais de seis anos de relacionamento. Agora, pensou, queimei as naves. Espero que ele não me chame mais para almoçar.]

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