quarta-feira, abril 13

Neto é filho com açúcar

Quero lembrar hoje uma daquelas últimas frases do próprio estilo Darcy de expressar o mundo: "Neto é filho com açúcar." (acho que por isso ela sempre foi gordinha - pelo menos desde que nasci!)

Minha vó nem era só minha, mas a gente [os netos] sempre gritava bem alto:
"a minha vó me de-eu" para ver quem reagia: só sua não ou então "vóóó, eu também queroo".

A verdade é que era. Minha vó era só minha. Todos tínhamos essa certeza. Não só porque ela nos remetia ao ideal esperado de uma avó: abraços, presentes fora de hora, o melhor arroz do mundo e a incrível ceia de Natal. Historinhas para contar, orações a ensinar, palpites prontos para dar. Não era por isso. A vovó era minha e de todos nós.

Cada um que a tinha perto de si via assim: parte sua.
Não que brigávamos por exclusividade. Vovó é que nos soube tornar únicos na vida dela. Parecia que seu coração queria aprender a pulsar no ritmo de cada um. Eu bem sei que ela gostava do meu ritmo coração-escola-de-samba, do coração-Chico da mamãe, do RitaLee da Érica.

Assim ela passou: uma MINHA para cada um: minha filha, irmã, mãe, vizinha, amiga, vó e bem (aí, sim, único caso que o gênero do possessivo muda: meu bem).

Eu digo minha porque o amor que tenho por ela ainda está aqui: vivo e único. Não consigo me ver como sou sem a intervenção dela. Quase tenho certeza que é assim para toda a família. Minha vó era referência, era essa pessoa que congregava todos os corações num só.

Nunca duvidamos disso, mas eu nunca tinha visto assim tão definido. E, agora, parece-me que faz todo o sentido do mundo que a tivéssemos como central de informações: ela sabia de todos porque amava a todos.

Ai de quem não ligava para ela!

E mais uma vez me repito: ela cuidava porque amava. E sofria porque amava. Não desistia dessa vida, suportava as dores porque nos amava.

A vó é minha, eu não abro mão desse possessivo, porque foi Deus mesmo quem quis que assim fosse. Mas esse amor individual não segregava. Essa mãe é minha, e sua, nossa. Sabemos como era completa a sua alegria se a reunião familiar tinha todos os corações presentes: o dela, com certeza, tocava concertos sinfônicos de amor e, claro, cantava também o caos que era alojar o povo inteiro nas festas e feriados.

Hoje, posso já antever vejo seu sorriso maroto e o brilho no olhar dela: de novo, juntos. Não quero desistir de ser com vocês família, porque a minha vó não perdeu tempo de nos deixar sempre unidos, com esse amor gordo, generoso, paciente, que se moldava ao jeito de cada um.