sexta-feira, dezembro 25

Diários Antárticos - parte I

Queridos amigos,

O dia começou às 5h e a decolagem só foi acontecer exatas cinco horas depois.
Chegamos no aeroporto do Galeão (o militar) com aquela movimentação clássica de segunda-feira. Três aeronaves na pista, gente esperando para ver se dá sorte (e embarca numa vaga sobressalente). Os destinos: Brasília, Recife e Pelotas.

Eu estava na tripulação da terceira, como vocês sabem.
Depois de ver a decolagem dos outros dois C-99 ou EMB-145 como aprendi que a aviação civil costuma chamar, fui esperar a minha vez.

Não demorou muito e apareceu tia Alice. Vocês ou já me ouviram falar dela ou vão ouvir falar muito. Figura lendária. Na primeira foto em anexo (tá vendo Tourinho, no fundo é tudo falsa modéstia quero mesmo te superar hehehe) aparece ela ao lado dos pilotos no momento do briefing da viagem.

Tia Alice foi a primeira comissária da Varig. Exatamente. Tem 57 anos de aviação. E exatos 20 anos de Antártica. Hoje perguntei quando ela foi pela primeira vez, já esta era a minha. Ela me responde no ato: Dia 17 de outubro de 1989. É isso aí, quando as coisas marcam a gente, lembramos do dia, da hora, e outros detalhes mais...

Ela foi uma vez, deu ordem na comissaria e desde então nunca mais deixaram de chamá-la. Também, pudera, a mulher é um primor. Super educada, suave, gentil, daquelas velhinhas magrinhas, cheias de energia...

Alguns já sabem da minha idéia, prefiro morrer cedo que ficar capengando aos 80. Mas se for para chegar como a Tia Alice, ah, Senhor, me deixe por aqui. Imagine você aos 60 anos descobrindo a Antártica???

Para quem sempre vou de FAB, ter comida a bordo e servida é luxo, é boirgois (Lais, socorra meu parco francês). Quente, então? E não é que essa senhora consegue, dentro de um avião ENORME, barulhento, cheio de carga, com pessoas sentadas em bancos laterais fazer um serviço decente? Mais que decente, carinhoso?

Hoje comemos um sanduíche quente com pão fofinho, recheado de presunto e queijo. Acompanhou: suco de laranja com gelo, café com leite (quente que tinha de soprar), frutas picadas (abacaxi e mamão!) e ainda um lancy!!! NUNCA antes na minha vida comi tão bem na FAB. Luxo. Lindo. E tudo na bandejinha. (viu só como eu sei falar algo além de sensacional e fantástico?)

Ela, muito querida, claro, me colocou ao lado dela e nesse dia, virei comissária. Até que é interessante...

Outra adaptação genial de tia Alice é o megafone, a segunda foto do anexo.
Ela faz aquela rotina de avisos por meio dele. Parece sem sentido, mas é que vocês não tem idéia do barulho que 4 motores a hélice provocam dentro do tubo do avião. SOCORRO. C-130 tem dessas aventuras. Então, ela recebe cada passageiro, ao entrar a bordo, com um sorriso e um tapa-ouvidos em mãos. Daí lá pelas tantas ela grita: atenção passageiros falta meia hora para o pouso, por favor coloquem suas poltronas em posição vertical. Metade da galera, os novatos, riem dela.

E o GELO?? Gente, gelo não vi nada, ainda. E nem amanhã verei, viu?
Só faremos a travessia (mesmo de avião eles chamam assim a ida ao continente antártico ou seria antártido) na QUARTA-feira.

Parece demorado, ne? Bom, mas vai de navio para ver como demora... E ainda: de Pelotas para Punta Arenas, no Chile, viagem que faremos amanhã, são SEIS horas de voo. Seis horas de barulhooo. Valei-me minhas clarices, meus amyr klinks e minha biblia, companheiros de viagem.

Acho que já deu, não? Vou começar a me preparar para dormir, amanhã a alvorada (toque de corneta, na academia) é às 5h. E ainda tenho de fazer um trabalhildo antes de sair. Mas não reclamo. Cada vez o sonho fica mais real.

Bom mesmo, de verdade, é dividir isso com vocês.


Beijos,

segunda-feira, dezembro 14

Antártica ou Antártida?



Tudo começou com ele. Não só a minha vida (para não ser piegas demais), mas também a vontade de voar e, lógico, de visitar esse continente instigante. (não vou dizer gelado, tá óbvio demais, estou de bronca hoje).

E por agora, quando todos ainda me questionam e me respondem, fica o embate no diálogo:

Ei você vai para a Antártida?
E eu, sim, estou embarcando para a Antártica amanhã.

Para mim, filha de piloto antártico, que convive desde 92 com uma casa cheia de pinguins (de pelúcia, de imãs de geladeira, em estampas de pijamas, mantas, etc), isso parece meio banal. Mas, lógico, não é.

Agora que refaço a rota sempre feita pelo meu pai, nos meus anos de começo de adolescência, relembro os dias em que escuta Big Mix, andava de bicicleta, jogava queimada e inventava caça-tesouros enquanto meus amigos incrédulos me perguntavam outra vez:

-É verdade que seu pai vai para a Antártida?
E, eu, sempre insolente, respondia:
- Já é a 10a vez que ele vai para a AntártiCA...

E a discussão pelo DE ou pelo CE rendia.

Hoje volto a essa rota (Pelotas-Punta Arenas-Base Eduardo Frei-Base Comandante Ferraz) e volto à mesma pergunta.

Para não enrolar e responder: TANTO FAZ. Não sei porque, mas detesto essa resposta. Se tanto faz, para que duas opções??!

Continuo preferindo a prosódia da cerveja. Logicamente por que cresci ouvindo essa versão. É a usada pelos milicos em todos os lugares. Vejam, o Programa da Marinha é PROANTAR, sigla para Programa AntártiCO Brasileiro.

Em português lusitano, o termo é Antárticda e sinceramente não sei se a essa altura do campeonato, com o acordo ortográfico isso influi em algo. Em espanhol, fica Antártida e em inglês fica Antarctica.

Achei outra boa explicação que reforça o termo escolhido como padrão pelos milicos:
O nome Antártica surgiu da versão 'romanizada' do grego Antarktiki, que quer dizer 'oposto ao norte'. Ou seja anti-ártico, antártiCO.

E ainda melhor explicada para quem tem mais paciência e curiosidade de ler:
Antártica é uma palavra de origem grega que reúne os termos anti (oposto) e arktos (urso), sendo que este último termo refere-se à estrela polar da constelação de Ursa Menor ou Little Bear. Esta origem etimológica sugere que, com base na teoria de simetrias e opostos, os gregos supunham a existência de uma terra desconhecida em uma região oposta à deles.

E vocês, que forma preferem?