sábado, março 28

Azul

Defina hoje, por um instante: depois dessas mudanças, qual a cor que diria como você está? Qual a palavra que te vem depois de tomar essa decisão?

>> Azul. Livre.

Escreva o texto. Não pense muito. (parte mais difícil, tenho que confessar).
Tudo bem, ganhei a tarefa e eis o texto.

Passa uma suave brisa na porta da casa.
Ela sente o cheiro do mar. Faz muito tempo que não o tem tão próximo. Resolve desligar o ar condicionado, abrir a janela, soltar-se dentro da camisola e dormir com o som roco e insistente do mar.

Acabou a ressaca, e a praia ainda está vazia. Depois que amanhece o dia, de manhã, o azul está diferente aos olhos dela: claro, real, palpável, permanente. Será que um dia vou pensar que o céu deveria ter outra cor?

O azul do mar está diferente: meus óculos escuros os deixavam com outra cor? Ela se perguntava...

Mas essa dùvida acidental não era agora motivo de angústia, de desordem ou conflito. Chega de debates comigo mesma. Agora, só tenho olhos para fora, pensou.

(e quando os olhos ficam para dentro? quando se fecham, cegam, se escondem?)

Não tinha nem preguiça nem vergonha. Só um pouco de miopia.

Resolveu que essa liberdade que tanto tinha custado aos olhos inchaços, horas extras em produzir colirio natural, e cansaço de olhar o mesmo rosto feio, apavorado no reflexo.

A pergunta do ano oito, para onde eu fui, se tornou, de repente a mesma resposta que é chave do nove. Para cá eu fui, cheguei aqui. E se antes me perdi, neste azul mais claro, neste céu mais real, agora me achei.

A liberdade dela, pensa, não é uma bandeira, camiseta, nem o poder de escolha ilimitado. Não, a liberdade é acordar, olhar nos seus próprios olhos e ver o azul deste mar, não na cor, mas na sensação de longos caminhos que ainda restam a trilhar.

Ela via, sim, que a vida ainda não havia parado, e que aceitar o horizonte, o seu limite, não significava ter de voar mais baixo.

De repente percebeu que sempre teve asas, mas como as de um papagaio doméstico semi-livre, elas estavam sempre cortadas. Ora, se as asas eram de sua natureza, o corte é que era bizarrice. Voltarei a deixar crescer quem eu sou. Quero minhas asas do tamanho que são para alcançar esse azul real, concreto, limpo, suave e envolvente.

Assim como me sinto e vejo agora> definitivamente não muito pronta para ser rainha de vida nenhuma, mas louca para ser dona de volta do meu nariz.

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