domingo, setembro 11

quero

Quero acordar sem ouvir a sua voz em mim,

Quero escutar meus passarinhos a conversar

Quero saber que sua vida não vai mais cair na minha

Quero tomar meu café sem lembrar da sua xícara vazia

Quero mergulhar na minha cama e não sentir seu corpo

Quero ver a lua cheia sem fotografar e te mandar

Quero sentir a brisa no meu rosto sem desejar ver seu cabelo despentear

Quero embarcar no meu voo sem esperar que você seja meu piloto.

Quero sorrir sem pensar na próxima vez que faria isso diante de ti

Quero me divertir sem ser por prova de mentira

Quero escrever meus poemas para quem sabe apreciar

Quero cantar para quem vai ler a minha partitura

Quero cozinhar para quem vai me trazer os ingredientes

Quero dançar para quem vai improvisar os passos comigo

Quero não saber antecipar a frase mágica

Quero viajar com quem sabe voltar.

Quero deixar livre quem sei que quer ficar, sair e voltar.

Quero dizer a verdade e ganhar a verdade em troca.



terça-feira, agosto 9

Corpo, água, alma

Só sabia que precisava, de novo, voltar a fazer algum exercício.
Cansada de tantas horas de aula, livros e fórmulas, procurava algo que me aliviasse a rotina e, ao mesmo tempo, me voltasse a mexer os músculos.
E num dia que mal lembro, vi que meu cursinho havia fechado um convênio com uma empresa de natação, ali ao lado. Resolvido. Fui no dia seguinte ver como seria.
Um tempo depois já tinha óculos, maiô e matrícula. Na primeira aula, me descobri a única aluna do horário de meio-dia.
Para quem não sabia nadar, foi um privilégio. Meu professor, cujo nome era quase tubarão (charlton, que me lembrava shark), passou a nadar também, ao meu lado, com o fim de me ensinar a me mexer em ritmo menos acelerado, sem ansiedade de chegar à borda.
Aprendi que para nadar tem que haver uma entrega à água.
Não lembro por quanto tempo tive "aulas particulares", mas passaram uns meses e novos alunos chegaram. E nessa mesma medida de tempo, meu corpo foi respondendo aos gestos. Condicionava os movimentos e organizava seus músculos. Lembro o estado de espírito com que saía daquela piscina até hoje.
Em menos de um ano, nadava os quatro estilos e me preparava para competir. Não só emagreci, mas mudei por dentro. Como a piscina era aberta, ainda tive o privilégio de estar bronzeada em pleno inverno. Decidi cortar o cabelo, mudei a armação dos óculos. Vinha de dentro para fora e de fora para dentro a mudança. Ali, certamente, aos 18 anos, comecei a me sentir bem comigo mesma.
Me lembro de um professor do cursinho que se espantou ao me ver, depois de voltar de férias: ---E o que foi que aconteceu com você? Se apaixonou?
Talvez. Por mim, pensei. Antes tarde que nunca.

segunda-feira, agosto 1

Sofia e Beto

Todos os anos, a mesma espera. Sofia conhecia aquele cheiro. Chegara o tempo que mais lhe satisfazia no ano. Era o florescer dos hibiscos amarelos, que anunciava a primavera em seu trópico. Era o tempo de manhãs longas, tardes douradas e o vento de sudoeste, sua melhor desculpa para não pentear os cabelos.

Naquele ano, ela não sorria ao se deixar emaranhar. Não seria mais o tal vento da primavera a desculpa que ela contaria à mãe para sua preguiça em se pentear. Desta vez, o vento veio. Só que a mãe não estava mais lá.

Ao receber aquela primeira rajada, Sofia lembrou-se dela, daquelas broncas, e viu seu rosto banhar-se de repente, num ventinho. Estou besta, pensou. Nada. Depois da morte da mãe, a vida ficou séria para a menina de 12 anos. Fazia apenas 8 meses que a mãe sucumbira a uma virose. Era a primavera solitária da Sofia e ela ali descobriu que as cores precisavam sair também do armário.

Os hibiscos vieram, mas com pouca força. Parecia que não queriam invadir aquela dor com tanta maestria de cor. Mas, de verdade, veio Sofia a explicar: “Foram o incêndio e a seca que levaram tudo, até o dourado dos hibiscos.”

Passaram as semanas e Sofia continua a esperar aquela arrevoada que seguia o vento sudoeste. Eram os azulões, assim ela os chamava desde que aprendeu a falar. Eram os pássaros mais bonitos daquela mata. E naquela época, migravam ao norte. Sofia esperava atentamente, acordava a cada manhã mais cedo e olhava. Olhava. Ouvia. Nada. Demoravam. Será que viriam, depois da queimada? E não sabia se era mais triste não comentar dos hibiscos com a mãe ou não ouvir o canto mais suave da floresta de seus amigos de passagem.

Um dia, quando ela parou de olhar para o céu, acordou com aquelas notas tão familiares. Respondeu com o assovio, ouviu a resposta. Ficou alerta, pulou da cama e num forte puxão, abriu a janela e quase derrubou o amigo que cantava para ela.

Onde estão os outros?, ela lhe dizia, como se o pássaro azul pudesse responder. E ele voltava a cantar, da beirada da janela. Sofia sorriu. E quem não se alegra ao começar o dia com uma surpresa destas?

E foi assim que em cada manhã, seu despertador vinha pontualmente lhe acordar. Cantava a melodia preferida e chamava Sofia para reconhecer o outro dia que estava a brilhar. Ela sorria de volta e esperava o resto do grupo aparecer.

Seu amigo passou a andar em seu ombro, cantar com ela a tarde emoldurada e lhe acompanhar nos passeios pelo bosque. A via plantar e colher. Caminhar e comer. Mas Sofia, em sua dor, não reparava que ao seu amigo cantava, mas não voava. E acho que passaram semanas até que a prima dela lhe perguntasse: mas e o Beto, não voa? Você não teme que ele vá embora?

Foi como se chovesse num dia de sol. Ou como se fizesse sol no meio de uma tempestade. Sofia ficou triste. E as escamas caíram de seus olhos egoístas. Ela nunca tinha reparado nisto. Um pássaro voa. Um azulão, mais ainda. Mas ela só queria a companhia dele e não percebia a tristeza do amigo. Depois daquela pergunta, o canto do Beto pareceu ainda mais apertado, daqueles que fazem força para sair do peito bonito. Mas ela não descobriu o problema. Só sentiu que suas asas não paravam bem no corpo, como se tivessem encurtado.

Sofia não desistiu. Consultou amigos na floresta, procurou outros pássaros, mandou recado por sua coruja, passeou em busca de plantas e ervas que lhe ajudassem. Beto não queria nenhuma. Não respondia a nada. Não acreditava que suas asas o levariam de volta ao céu.

Uma tarde, Sofia e Beto estavam em seu piquenique habitual. Ela levara mel, tangerina, banana e balas de coco. Beto cantarolava em seu ombro, ela contava fábulas que aprendera com sua mãe. Quando, sorrateiramente, Beto caiu de seu ombro, trepicou num semi-planar e prendeu em seu bico, no ar, a vespa que morderia a mão esquerda dela. Sofia se estremeceu. Ficou pálida. Não sabia se era pelo quase voo do Beto ou pelo susto da vespa. Ela sabia que era alérgica. Uma picada virava febre depois, no mínimo. Mas e o Beto sabia? Intuia? Como... ?

Quem não se aguentava era o Beto. Depois de meses sem esticar aquelas penas, ele fez aquilo. Cantava como se fosse espantar outro macho. Sua voz era nítida, forte, alta que outros passarinhos por perto, começaram a lhe responder. Sofia teve os olhos cheios de água. E, depois daquele dia, passou a caminhar com o Beto por lugares mais difíceis, onde ele poderia se jogar e se sustentar. Ela estaria sempre lá, no pé da árvore, para lhe escorar. Beto teve mais coragem, resolveu tentar.

A primavera corria com suas surpresas. E depois da queimada, ia recuperando a mata aos poucos. Outras cores de hibiscos floresceram. E também as sibipirunas, os guapuruvus, os baixos arbustos e algumas orquídeas. As onze-horas, animadinhas, se abriam às dez. E as tardes terminavam mais douradas que no começo.

Os dias passaram até que Sofia ouviu a arrevoada. Saiu de casa e o Beto já louco, pulava da janela aos galhos. Voava em pequenos planos, mas tentava sair dali. Ela sentiu que o vento soprava, agora, era sul-sudeste. E um arrepio lhe subiu o corpo. Sofia sabia que a hora chegara, Beto partiria.

Num impulso, levou a velha gaiola para fora da casa, pendurou os poleiros no pé da árvore. Deixou as tangerinas por perto e zapt! capturou seu amigo. Beto calou-se. E, mais tarde, passou a voar sozinho e bater nas grades.

Sofia viu a cena e não acreditava. Sim, ele voava, não se apoiava mais nos poleiros, não ficava no chão, voava tanto que se machucava. Os azulões começaram com o famoso sobrevoo da primavera. Voavam juntos, separados, escolhiam árvores, brincavam de se esconder. Cantaralovam e depois levantavam voo todos juntos. Uma coreografia tantas vezes admirada por Sofia e sua mãe. Mas naquele dia, ela só tinha olhos para aquelas grades. E perdeu o seu espetáculo preferido de primavera.

Beto cansou e ficou mudo. Sofia só chorava, não queria abrir mão da companhia dele. Não poderia passar mais suas tardes sem aquele canto. E mesmo com o pássaro ali, perto, em seu lado, perdeu a melodia. E ela que o ajudou a voltar a voar agora o deixara ali guardado.

Sofreu uma noite em claro.

No dia seguinte, eles voltaram. Com mais luz, mais vento e melhor canto. Ela sabia. Beto tinha de ir. Abriu sua janela e todas as portas da casa. Colocou seu vestido preferido, descascou a última tangerina da estação e com a fruta numa das mãos, abriu a gaiola para o Beto.

Tímido, cansado, ofendido, ele saiu. Comeu em suas mãos sem fazer qualquer movimento de decolagem. Ela sorriu enquanto fingia não chorar. Olhou o amigo, em suas mãos, e o empurrou do mesmo jeito que sempre fazia, nos treinos. Ele não soltou dos seus dedos. E ela o jogou novamente. Vai!

E ele já não teve mais dúvidas. Subiu sem restrições.

Sofia chorava. Foi-se embora sua companhia.

E sua dor era tanta que naquele dia não foi ver o por-do-sol. Ela queria acreditar que talvez tivesse sido um sonho e não um dia de verdade. E que seu amigo, entregue, talvez voltasse.

Mas ele nunca voltou.

Em Sofia ficou a saudade que lhe fazia chorar cada vez que o primeiro hibisco abria e o vento mudava. Foram três primaveras até que ela entendesse.

Ela não perdeu um pássaro. Ela ganhou a todos.

Por que a cada vez que via um azulão voando, solto e livre, relembrava com carinho do seu Beto. O passarinho que voltou a voar por suas mãos.

E o pássaro que ensinou Sofia a voar... nas asas da liberdade do seu amor.


terça-feira, julho 5

Waiter

My dearest,

I told you over the phone that I would write when I had the time. Better, when I had THAT quality time in which you feel extremely good on spending it without that rush. It comes to a sentence told me by Marcelo, which I kept in heart: it is good to do things with time. He said it trying to argue that his 45min bath was not long. But I understood it bigger: it is good to do anything with time. Meaning, I am here just thinking about this and nothing, that I reckon, will interfere me on stopping it. I want to do it now, my amount of time seems more than enough and it feels just great to use it this way.

After all this useless commencement speech (sorry dear reader), I will start, definitely writing what I had in mind when I opened my mac book.
I decided that I will wait. I'm tired of searching, looking for, conquering, being anxious, having ideas and being proactive. Now, I am a waiter. Time will serve me, not the opposite. I will wait things to happen, event if there is nothing more to happen than my shower not being able to heat the water well enough.

One may say, oh, please, Fernanda, don't be so negative or pessimist. Indeed, it is quite the opposite. By waiting, I'm forcing myself to be optimistic. Would anyone wait for an earthquake? I would run away, knowing it was coming.

This extremely difficult task that I am setting myself is not a naïve or lazy one. To know me and realize how difficult this would be to myself would only take the reader a single line on a dialog. I'm anxious. I'm a doer. I hate to sit in front of my computer for nine hours a day. I am the one telling colleagues to do more that we have done last year, meaning more work, more dull things to organize. You know, I rock.

But here I am. Tired of expecting all crazy things about life. A huge-duper-mega-blaster sunset, an incredible song to play, a masterpiece movie to watch, a smart man to talk to (this, I guess, the hardest one to find --- oops, just kidding, it is to make readers laugh).

"God does not need our help". I've heard this from a friend, a line that made me go deeper and deeper each time it came in to my thoughts. But I keep trying to help him. I will call that guy, I will write another one, I will buy a glass of wine. Expecting this or that to happen. Waiting for that kind of attitude. Planing that perfect weekend. And things fail, here and there. Sometimes, it really occurs as we wanted, sometimes it does not. And the difference between the two of them? Comparing what I deposited on each situation, no difference at all. Conclusion is He does not need me. It happens when it is proper. Period. I can antecipate, prepare, expect and bingo! And do the same thing and bullshit!

The truth on that sentence relies on faith: I waiting on God but I not lying on my couch. I will keep everything running, just by doing that to wait more on Him.

Let Him bring me what I need.

Everytime I did it, He surprised me. To show me that His love was greater than my lack of faith (because on those occasions I did wait with no hope and by tiredness).

Now, I will allow myself to get inside His wishes and dispositions.
Meanwhile, I will buy a new shower, of course.

terça-feira, fevereiro 8

Em Congonhas, numa sexta, ao meio-dia

Bom dia, São Paulo.

Hoje amanheço entre suas pixações e seus cimentos. Caminho por suas ruas, esquinas conhecidas, cheias de lembranças. Vejo suas calçadas quadriculadas e sinto o frio tão comum dos seus dias cinzas. Mas é novembro.

E, neste mês, sem impor-me prazos, te aviso, o meu, com aquele teu filho, venceu. Escuto você, São Paulo, a me sussurrar na memória dias alegres e por aqui, outras horas de angústia e espera. Me parece tão próxima e distante. De novo, vamos fazendo as pazes e vem você, cidade, a querer me cicatrizar de suas próprias marcas.

Parto sem companhia. E em ti não ganhei nem um beijo. Mas não volto para casa com dúvidas ou certezas sem futuros. Há isso?

Você me sorri, me lembra que foi testemunha desse amor, que passeou comigo de volta à vida, que me proporcionou prazeres e descanso. Eu não sorrio. Concordo. E te digo, ah, São Paulo, mas você é tão fria. Me envolve, mas nunca acalenta; me amadurece, mas não me acompanha. E, principalmente me suga ao fazer promessas vazias.

Ao contrário, te surpreendo pois ando por aqui agradecida. Pisei em ti e não ouvi a voz do seu filho que partiu. Não pude e não quis. Naquele bairro não entrei. Te conto isso não cheia de orgulho, mas suave de não ter mais essa angústia.

Te conto, São Paulo, que aqui não está mais a fonte da minha alegria ou também de uma ilusão. Você me acena e concorda. Faz tempo que acabou e agora sabe, fui eu mesma quem acordou.

Volto para casa sem lembranças tuas. E quero, por lá, descobrir-me mais distante de você. Sem deixar por aqui o coração partido. E quanto alívio ao ir-me embora sem querer ficar!

Não vive mais você, São Paulo, comigo num sonho. Vive só, em seu canto na minha memória. Te vejo me olhar com saudade e carinho, mas sem reação. Se volto, se te procuro, não sabes mais. A novidade é que eu agora descobri: você não me espera. Nem eu.

Te estimo, São Paulo, mas não te desejo mais.

Adiós.

segunda-feira, fevereiro 7

Vá, eu quero ficar

Ouço sua voz que me parece descanso, mas ela me traz o passado. Ela me promete nada, apenas o instantâneo. E isto não é o suficiente mais. Ela antecipa e prepara o encontro com doses homeopáticas de carinho. Ralo, ainda que você o veja real.

Meu coração, que decidiu, por um tempo indeterminado, tirar greve de todo o resto do ser, é o único, em mim, que insiste em ver alguma veracidade em sua voz. Ela fala, apenas. E pouco. Mas é impalpável e distante.

Então, o tonto coração se prepara todo e arruma o resto do corpo a te receber. A voz traz o atraente abraço, o quente sorriso, a companhia confortável. E se alguma vez houve meio termo nisto, lhe traz de volta. Não é mentira. Nem verdade. E o prazer do encontro é cortado pela noção do efêmero. Minha razão e todo o consentimento me dizem simplesmente que estou sendo sugada.

Sabe quando você abastece? Você sai cheio, e eu fico vazia. O processo é simples assim. Nem você, conscientemente, me quer fazer este dano, mas nem eu quero me deixar inteira. Por que o estúpido coração resolveu se deslocar do sistema. E você aparece com o que tem e me carrega com o que trouxe: doença, consultas, provas, medos. Não me pergunta sobre os meus dilemas, segue em frente, descarrega e o meu coração se farta em acomodar tudo teu, lá dentro.

Mas eu volto. Não consigo depois andar de tão pesada. Me esforço, vem não a raiva, mas a tristeza. E eu que me meti nessa, agora vou tirar.

Nem me venha, como um vampiro, me sugar as energias, me pedir atenção, me querer perto como um amparo, descanso, companhia para depois nem me ver ao dar bom dia.

Não
quero algo etéreo, esfumaçado, sem nome ou com poucas palavras.
Não quero uma voz que não tem firmeza para a verdade.
Nem me venha me colocar no seu jogo, na sua viagem.
Enquanto você voa, eu vou ficar com os pés no chão.

quinta-feira, fevereiro 3

maquiagem e causalidade

Depois daquela faxina para deixar o armário habitável, onde forão descobertos perfumes não usados e guardados; esmaltes; estojos de sombras esquecidos; óculos de natação que tinha dado por perdido, a conclusão foi inevitável: por que deixei de sair de casa maquiada?

Adepta ao estilo "é bom estar sempre bem", sair com máscara nos olhos e batom nos lábios era, no mínimo, a sensação: pode vir, estou preparada. Ou quase (rs). Com a maquiagem esquecida ou guardada, veio a evidência do descaso.

Tudo isso para dizer que vale a pena.

Resolveu que acordaria com mais tempo de antecedência do horário habitual, para ter tempo para si. E acordar. E tomar um bom café, com direito a ler, quem sabe, uma ou duas páginas da Bíblia antes de sair de casa. E o fez. Na segunda-feira. Escolhe o vestido e sai, desta vez, depois de meses, preparada. Chega ao trabalho pontualmente, coisa rara. E ri para si mesma da liberdade que sentiu ao se arrumar só para se sentir melhor. Sem precisar de nada nem ninguém a mais como estímulo ao batom.

Chega a hora do almoço, encara o calor de 30 graus na cidade seca para encontrar a amiga. Depois de comprar a redinha para o cabelo (ela voltara ao ballet), vai tirar o carro da vaga. E espera o carro vermelho passar. Espera! Ei, espera! E não é o Márcio dirigindo????

Ui.
Ela nem se abala. (Ou quase). Olha diretamente para ele como quem quisesse dizer o de dentro. Sorri de lado e espera que ele a veja. O carro passa rápido, mas aquele olhar, ela sabe, não passa desapercebido. E... ele tira a mão do lado de fora do carro! Sem querer, mas querendo, sai moça da vaga, decide alterar o percurso, e pára, no sinal, bem ao lado do carro dele.

Espera. O sinal fecha. Ele abre a janela da direita.
Ela se vira, põe a mão na janela, encosta a cabeça, e escuta "como vai, moça bonita?"
Ela ri e pensa, tira a mão do cabelo, tira a mão do cabelo!, não precisa dar na cara. Responde e a conversa flui. E ele naquele carro vermelho. Não precisa sentar lá dentro para sentir o cheiro. Do outro lado, o rapaz se deleita. Tenta disfarçar, mas não cola.

Logo, a luz verde indica o fim do encontro improvável e inesperado.
Ele se despede, um beijo. E ela, louca, responde, vários, antes de engatar a primeira.

Viu só como o lápis, rímel e batom valem a pena?, ela ri e pensa, nem reclamarei na hora de tirar, de noite. A maquiagem. E algo mais.